Insurreição vibracional
A insurreição vibracional prescinde de propósito, de bandeiras, de estatuto, de manifestos. A insurreição vibracional somente se propõe a desreferencializar. Toda a referencialização, mesmo que linguística, biológica ou sexual, vai traçar eixos cartesianos para o poder “localizar o inimigo”. A desreferencialização impossibilita o vórtex tornar-se alvo. Quanto mais desreferencialização, mais liberdade. Em outras palavras, na insurreição vibracional, só nos interessa devir.
Nada é mais negligenciado que o efetivamente poético.
Thomas Bernhard
Estou me transformando em algo que ignoro; isso fala através de mim.
(…) Há algo invisível que impele nossa vida rumo ao inesperado.
Nastassja Martin
O que fazer?
Quando alguém se torna ciente dos problemas que o mundo está enfrentando, perguntar-se qual a atitude mais ética torna-se, aparentemente, algo angustiante, de difícil resposta. Vivemos uma era em que a mente, a cognição[i], o sistema imunológico, as narrativas e a justiça foram hackeados. O que chamamos de anarquia sagrada[ii] traz precisão para apreender tais hackeamentos.
A anarquia sagrada é expressão política que apreende o cosmos como auto-organizado e autoconsciente, implicando na autogestão como organização política mais em ressonância com o cosmos. A anarquia sagrada propõe como ética a capacidade cada vez mais ampla de modulação das vibrações cósmicas e entende como perda da ética ou efetivação do poder a restrição da capacidade dessas modulações. Os hackeamentos são um tipo dessa restrição de modulação.
Uma das dificuldades em se apreender o problema está na obnubilação do fato de que o nazifascismo continua operando por expressões diferentes. A lógica bélica inclui largamente a propaganda e o hackeamento que estamos detectando, além de um programa neomalthusiano global. Os políticos estão sendo domesticados pelo Controle Transnacional, produzindo-os e chantageando com dossiês. Grande parte dos políticos que atingem grande expressões só a conseguiram porque há dossiês contra eles.
Diante dessas observações, o que se pode fazer enquanto ato ético? Pois, se o Controle Transnacional possui sua capilaridade nos meios de informação, na justiça e até nas mentes de grande parte da população? Fazer campanha para determinado político faz sentido? Há alguma possibilidade de efetivar ações éticas por meio de representações “democráticas”? Há algum processo institucional de larga monta fora do alcance do Controle Transnacional?
Se o processo representacional político é ineficiente para alguma ação ética efetiva e se as massas são dominadas por vários tipos de hackeamento, o que fazer?
A anarquia sagrada tem, como seu maior esplendor, uma insurreição vibracional. A primeira preocupação é em adquirir uma proficiência no exercício em vórtex dos transaberes ou de uma meditação eficaz. A questão é modular as vibrações de modo que as ressonâncias deixem de operar nas ressonâncias de poder, que são sempre restritivas, ou seja, ampliar cada vez mais sua capacidade de modulação, desviando-se das restrições. Em seguida, ter consciência que essa maior capacidade está em ressonância. Na medida em que se apreende uma maior capacidade de modulação, isso serve como uma espécie de diapasão cósmico para que outros vórtexes entrem em ressonâncias com frequências mais livres e éticas. Até mesmo a cosmologia já propõe uma solidariedade cósmica, dada a ubiquidade das suas interações e que a catástrofe é sempre local, nunca global[iii].
Uma insurreição vibracional prescinde de ter um “projeto político” específico, pois isso é sempre local e temporal. No entanto, cada vórtex que vibra em ressonância com essa ética, permite que o aqui e agora seja mais ético. Inexiste uma proposta que faça elogios à determinada ideologia, político ou organização estatal: todas essas são expressões de poder e de restrição das modulações. O único axioma da insurreição vibracional é o aumento da capacidade de modulação, sendo que a singularidade do vórtex vai expressar essa ética de modo singular.
Assim, inexistem inimizades ou nêmesis, que é uma invenção para tentar separar o inseparável: o poder inventa ações “contra” qualquer coisa, inclusive contra ele mesmo. O estatuto do ir contra, da guerra, do desejo de “vencer o inimigo”, vai alimentar o poder indefinidamente.
A insurreição vibracional prescinde de propósito, de bandeiras, de estatuto, de manifestos. A insurreição vibracional somente se propõe a desreferencializar. Toda a referencialização, mesmo que linguística, biológica ou sexual, vai traçar eixos cartesianos para o poder “localizar o inimigo”. A desreferencialização impossibilita o vórtex tornar-se alvo. Quanto mais desreferencialização, mais liberdade. Em outras palavras, na insurreição vibracional, só nos interessa devir.
Sabe-se que o polímata é brincante[iv]. Na insurreição vibracional, o insurreicionista está co-movido por alegrias, porque brinca com os saberes e com as vibrações cósmicas. A insurreição vibracional aumenta a capacidade de modulação e, por isso, traz alegrias. Se a alegria é ausente, deve-se atentar para que algo na insurreição vibracional está equivocado. Apenas guerreiros são sisudos.
A insurreição vibracional se dá por ressonâncias que se dão na diferença. Assim, a insurreição vibracional jamais busca um regime comum. O comum é o Paradoxo na instância de vibração máxima[v], ou seja, emergimos singularmente de algo adimensional e atemporal que vibra infinitamente e isso é o mais próximo que vislumbramos de um comum.
Na insurreição vibracional inexiste bordões, muito menos “gritos de guerra”. A insurreição vibracional, quanto mais estamos galvanizando suas ressonâncias, mais emerge em nós expressões poéticas, ou seja, o contágio da insurreição vibracional se dá por ressonâncias, que muitas vezes vêm acompanhadas de poesia.
Na insurreição vibracional inexiste intento, exceto o desejo de desejar, devires. Toda vez que sua militância lhe deprimir, apreenda que é uma pista de que algo já está controlado, em ressonância com o poder, com o Controle. Investigue sua tristeza, seu desapontamento com o “sistema”. Perceba que o Controle lhe inoculou uma moral de como a vida deve ser e que, para isso, deve-se “lutar”. Toda luta gerou condições para a próxima luta, numa Roda de Samsara guerreira. A insurreição vibracional prescinde de lutas, de líderes e contagia pela alegria, alegria em modular infinitamente.
Todo o resto são variações da prisão. A insurreição vibracional ocorre aqui e agora. Sem hora marcada (ainda que possa ocorrer, provisoriamente, combinações), sem planejamento excessivo, muito menos recrutamento.
A insurreição vibracional é espontânea.
Notas
[i] Ver artigo “Guerra cognitiva”, de François du Cluzel. Trata-se de artigo do Inovação Hub, parceiro da OTAN, que propõe hackeamento cognitivo, pois “o inimigo” está fazendo o mesmo. A transformação da empresa Facebook em Meta, a partir da ideia de Metaverso, pode ser apreendida como uma espécie de desdobramento dessa guerra cognitiva, no sentido que até mesmo a capacidade de conceber outros mundos seja também hackeada. Sobre isso, ver artigo “Metaverso: a aposta transumana do Grande Reseat Global”, de Wilson Ferreira.
[ii] Ver nosso livro Vórtex: modulações na Unidade Dinâmica.
[iii] Quantum e cosmos: introdução à metacosmologia, de Mario Novello.
[iv] O polímata: uma história cultural de Leonardo da Vinci a Susan Sontag, de Peter Burke.
[v] Ver nosso artigo “Tratado da Contundência: preâmbulo de um inescrito”.